Blog do Instituto Casa de Autores, uma organização sem fins lucrativos cujo objetivo é fomentar a leitura e qualidade dos escritores no Brasil.

quinta-feira, 28 de março de 2013

Riqueza: uma questão de sintonia emocional




Muitas pessoas têm uma fantasia mágica de que ganhar dinheiro e enriquecer tem a ver com sorte, com desonestidade ou com prêmio de loteria. A riqueza é a gente que faz, não vem de fora, mas de dentro. Tem a ver, primeiramente, com a nossa forma de ver o mundo e os relacionarmos com as pessoas, com a vida. A pobreza e a riqueza existem não só no campo dos recursos financeiros, mas também no das ideias, afetos, desejos etc. A riqueza e a pobreza estão dentro de cada um. Antes de ir para a esfera financeira, elas passam pela vida afetiva e emocional.

Cada sujeito tem uma forma particular de pensar, sentir e agir diante da vida e também de reagir frente ao dinheiro. Lidar com as finanças de forma equilibrada ou insana não tem a ver com a quantidade de dinheiro no banco, mas com essa maneira de se posicionar frente ao mundo, às crises e às pessoas. O jeito de manejar e administrar os recursos é mais importante do que a quantidade de bens que se tem. Há pessoas que ganham pouco e vivem bem. Há outras que ganham muito e estão endividadas.

Os indivíduos de mente pobre são limitados para perceber as oportunidades de enriquecimento, a começar pela forma restrita de ver o mundo. O mundo é abundante. O universo é abundante. Tem para todos que querem ter. Infelizmente muita gente não quer porque ter significa, muitas vezes, romper com o padrão aprendido, arriscar.

Muitas pessoas têm medo de enriquecer e manejar grandes quantias de dinheiro. Nesse caso, é mais “seguro” não ter muito. Se há um conflito interno sobre enriquecimento, é provável que o medo fale mais alto e impeça a pessoa de crescer. Esse sujeito sente-se acomodado e não procura opções de crescimento. Fica tolhido, sem se desenvolver, esperando uma ajuda externa (do governo, da família etc). Reclama da crise, mas não busca melhorar.

Já a pessoa de mente rica pensa grande, vislumbrando horizontes, vivendo as experiências como uma oportunidade de aprendizado e de investimento. É arrojada, e mesmo com medo, age!

Para ativar a riqueza dentro de si, é preciso, em primeiro lugar, se sentir importante e necessário para o mundo, para sua família, para sua comunidade, procurando se aprimorar naquilo que faz.

Antes de construir uma riqueza financeira, é importante estruturar uma vida rica: de aprendizados, experiências, informações, projetos, contatos, sentimentos etc.

Uma pessoa verdadeiramente rica tem não só dinheiro, como cultura, paz de espírito, educação, pessoas queridas a sua volta e, principalmente, dignidade!

Se uma pessoa tem uma crença interna de que não tem nada para ela, que tudo é complicado, que as crises nunca acabam, dentro dessa linha, ela acaba vivenciando mais e mais experiências difíceis e acaba se focando em acontecimentos negativos para si.

O mesmo acontece se a pessoa se conecta com a saúde e com coisas boas e positivas. Ela passa a vivenciar mais e mais situações agradáveis, de bem-estar e esperança.

Muitas pessoas, em vez de se concentrar no que é possível, perdem muito tempo pensando sobre o que não têm. Assim, se tornam irritadas e ressentidas com a sua situação, o que cria mais limitações e barreiras nas suas vidas. É mais fácil prosperar quando se tem um estado sereno da mente. Porque tudo em que se foca tende a crescer.

Quando você começa a pensar que pode, seus pensamentos ficam mais poderosos. E, quando se sente mais poderoso, tem a energia necessária para impulsionar-se para os atos que criam uma vida de riqueza verdadeira.

Experimente escolher em que lado você quer viver a vida! E arrisque-se!


Angélica Rodrigues Santos
Professora, psicóloga e autora do livro “Família, afeto e finanças – como colocar cada vez mais dinheiro e amor em seu lar”, em parceria com Rogério Olegário do Carmo

segunda-feira, 25 de março de 2013

Caminhos do riso



Esta pesquisa tem como título "Caminhos do riso" porque percorro diferentes estradas para investigar o riso. O que deu nome a esse trabalho foi o filme de Fellini "A estrada da vida", caminho que percorro no primeiro capítulo. Para estudar o riso, foram criadas algumas alegorias tomadas emprestadas entre as inúmeras imagens e sons que compõem a vida contemporânea.

Neste trabalho, realizado na Faculdade de Educação da Universidade de Brasília, área de concentração Tecnologias Educacionais, encontrei oportunidade para sistematizar minhas reflexões sobre o riso. Pude unir várias áreas de conhecimentos presentes em minha formação: artes cênicas, educação, ciências sociais. Na época em que cursava sociologia, consegui desenvolver um olhar importante como pesquisadora. O que aprendi de mais interessante foi uma profunda paixão pelo objeto de pesquisa, tendo momentos de observação, distância, reflexão e participação.

A experiência como atriz foi a que despertou em mim o desejo de escrever e de pesquisar o riso e saber suas fontes, origens e potencialidades.

Outras fontes que foram suportes à minha busca pelo riso, para o meu trabalho enquanto atriz e que me trouxeram reflexões e inspirações para os meus sonhos foram Herbert de Souza e Paulo Freire. Encontrei o sociólogo Herbert de Souza no Fórum do Pensamento Inquieto.[1] O Herbert de Souza falava sobre democracia. Utilizei pela primeira vez o método Paulo Freire em um grupo de alfabetização de adultos, coordenado pela UnB. Alfabetizávamos funcionários da limpeza da UnB.

Assumi a disciplina de artes em escolas de ensino fundamental e ensino médio. Observei a importância do riso para o aprendizado do aluno, uma vez que o riso desperta o interesse e o prazer do educando em aprender. A motivação e o desejo de aprender podem gerar maior aprofundamento no conteúdo porque propiciam concentração, participação, dedicação e divertimento no aprender.

Certa vez, fui convidada a visitar uma escola para contar histórias indígenas. Nessa escola, parecia que todas as áreas de conhecimento estavam integradas e presentes em suas brincadeiras e curiosidades. Quando cheguei lá, estavam fazendo uma oca com galhos de árvores e bambus e dentro dessa oca contei histórias. Percebi a sensibilidade dos alunos em relação à natureza. Essas crianças, na verdade, eram integradas à natureza. O riso estava presente no bem-estar delas.

Descobri com a oralidade, ouvindo histórias, que ensinar é uma palavra de origem cigana que significa colocar o outro em sua sina. A educação, servindo a esse propósito, faz que o educando descubra e siga o próprio caminho. A dimensão da educação passa a estar a serviço da liberdade e da criatividade, formando pensadores diferentes e capazes de, com sua subjetividade, expressar e intervir no meio em que vivem.

Ao pesquisar o riso, deparo com interrogações e inquietações que me fazem percorrer diferentes estradas: qual a relação entre o riso e o choro? E entre a opressão e o riso? Qual a relação entre o erro e o riso? E entre a democracia e o riso? Qual a relação entre o riso e o tempo? O riso é proibido? Como são os diferentes risos, ironia, humor, riso grotesco? Qual a diferença do riso artesanal e industrial? Como seria o riso festivo?

Essas perguntas são refletidas, levando-nos a pensar sobre a contemporaneidade. Convidam o leitor a percorrer algumas estradas onde estarão imagens e sons que o ajudarão a investigar o riso. Nessas estradas, aprofundo inúmeras imagens e faço novas descobertas. Na primeira, "A estrada da vida", estrada que percorro com Federico Fellini, o riso se relaciona com a figura do palhaço presente na relação dos personagens Gelsomina (foto) e Zampano, que são artistas mambembes de circo.

Na segunda estrada, o riso é estudado no movimento das cirandas presentes nas pinturas "Ronda infantil", de Cândido Portinari, e "Alegorias e efeitos do bom governo", de Ambrogio Lorenzetti. Na terceira estrada, me reporto à história do riso e reflito a respeito do riso na atualidade, caminho pelas imagens e sons dos filmes "O nome da rosa", baseado na obra homônima de Umberto Eco, e "Ladrões de sabonete", de Maurizio Nichetti.

Na quarta estrada, observo as características de diferentes risos e suas ambiguidades, percorrendo o universo da imagem de Bosh na obra "Cristo carregando a cruz". Na quinta estrada, estudo o riso festivo ao adentrar a obra "O enterro da sardinha", de Goya.

Clara Rosa Cruz Gomes
Apresentação do livro "Caminhos do riso", Editora Claridade


[1] O Fórum do Pensamento Inquieto ocorreu na Universidade de Brasília, organizado por Clodomir de Souza Ferreira, João Antonio de Lima Esteves e Laura Maria Coutinho, em 1992.

quinta-feira, 21 de março de 2013

A polêmica da avaliação nas redações do Enem



Na vida real, profissionais da escrita, como jornalistas, publicitários, redatores, assessores, escritores, nunca entregam os textos para publicação sem antes passar por uma etapa de reelaboração e revisão. Essa etapa varia de redator para redator. E todos confiam no trabalho do copidesque e do revisor. Milton Hatoum declara que reescreveu o livro Dois irmãos 23 vezes antes de entregá-lo para a editora. E é preciso considerar que a editora tem um serviço de revisão, e o autor deve aprovar a forma final do texto, após uma última leitura.

Gabriel García Márquez confessa, nos agradecimentos de O general em seu labirinto, que submeteu os originais a vários leitores antes da publicação. E não há um jornalista sequer, por mais experiente que seja, que encaminhe um texto para ser publicado na primeira versão. Faz parte do processo da escrita rever, reescrever, reelaborar, revisar. E, nessa etapa, é natural consultar dicionários, gramáticas, enciclopédias e colegas, para tirar dúvidas, seja de conteúdo, seja de convenções da escrita ou de estilo.

Isso porque nossa língua oferece muitas dificuldades. Vamos focalizar aqui apenas algumas delas. A grafia do som (s), citada na matéria de O Globo (18/3/2013, página 3), por exemplo, é muito difícil. Há muitas possibilidades na língua: um c: acento; dois ss: assunto; um s: ensaio; x: máximo, trouxe; sc: nascer; sç: cresça; xc: exceção; ç: ação. Grafias concorrentes como x e ch, s e z também estão entre as que oferecem mais insegurança na língua portuguesa para o redator.

E não há uma regra produtiva que resolva todas as dúvidas. Portanto, para memorizar a grafia convencional desses sons em cada um dos seus contextos, é necessário ter muita convivência com a língua escrita, muita leitura. Carregamos, nós todos, escritores, professores, jornalistas, incertezas pela vida afora. E, vez por outra, precisamos consultar o dicionário para tirar dúvidas da escrita de palavras de uso corriqueiro.

O candidato do Enem está numa situação especial: sob pressão psicológica e de tempo; sem autorização para consultar dicionários, gramáticas ou colegas; sem tempo e sem calma para várias revisões. Essas condições de produção impedem que o texto alcance o mesmo sucesso daqueles elaborados na vida real, que obedecem a um processo natural de consultas e revisões.

Por isso, a banca é orientada a ser mais concessiva e desconsiderar alguns desvios quando o texto é muito bem estruturado; demonstra entendimento adequado do enunciado; desenvolve o tema de forma consistente; apresenta e organiza informações, fatos, opiniões e argumentos de maneira coerente e coesa; obedece às exigências do gênero dissertativo-argumentativo e indica uma intervenção para solução do problema focalizado, respeitando os direitos humanos.

Todos esses elementos da versão avaliada indicam que, se houvesse uma segunda oportunidade de reescrita do texto, ele chegaria facilmente a ser um texto muito satisfatório para o nível de desenvolvimento da linguagem escrita esperado para alunos do ensino médio. Desvios de grafia, acentuação e concordância são evidentes e podem ser facilmente corrigidos numa revisão cuidadosa. Problemas estruturais de pensamento e de organização das ideias são muito mais complicados, exigem a reelaboração de períodos, a reorganização de trechos inteiros, a substituição de segmentos, a eliminação de termos, a reordenação de parágrafos.

É preciso lembrar também que a banca trabalha com cinco níveis para atribuir a nota, e não há nesses níveis divisões em décimos, centésimos ou milésimos. Assim, a apenação não individualiza o desvio, mas considera o resultado geral do texto. Além de todas essas observações, caso a banca não considerasse as condições de produção dos textos do Enem, e se comportasse de forma rigorosa ao extremo, provavelmente nenhuma vez fosse concedida a nota máxima.

Lucília Garcez
Autora de Técnica de redação (Editora Martins Fontes) e professora aposentada do Instituto de Letras de UnB

terça-feira, 19 de março de 2013

No boxe e na vida




Hoje de manhã encontrei-me com um ser insuportável, desses que gostariam de pôr pra baixo até o pico da Bandeira, com seus 2.892m, conhecido por sua lendária firmeza. Memorizei a altura exata desse pico, que fica próximo à minha cidade natal, pois durante anos sonhei em escalá-lo, antes do aparecimento da artrose nos joelhos. Agora, só por um milagre do padre José de Anchieta, aliás, beato e futuramente santo, que, ao que tudo indica, sofria de uma doença reumática e sentia muitas dores nas articulações.

Voltando ao papo sinistro, quando eu ia começar a ficar meio baqueada, depois de ouvir por alguns minutos a tal pessoa nefasta, de repente lembrei-me de uma marcha carnavalesca e, quando dei por mim, já estava cantando a plenos pulmões, enquanto dirigia defensivamente o meu carrinho sem direção hidráulica: "Você quis me dar o golpe/ mas eu soube me esquivar/ já lutei como o Hélio Gracie/ já briguei com o Valdemar".

É preciso ressaltar que eu era bebê quando a marchinha, da autoria de Antonio Almeida e, se não me engano, de Zé Tinoco, intitulada "Marcha do golpe", animou o carnaval de 1956. Mas, como marcou um fato histórico, foi muito importante para a geração de meus pais, no tempo que as músicas carnavalescas faziam a crônica do cotidiano brasileiro.

Nas eleições do tumultuado ano anterior, Juscelino Kubitschek, para alegria de minha mãe, sua fã incondicional, fora escolhido presidente da República, vencendo nas urnas os candidatos Juarez Távora, Ademar de Barros e Plínio Salgado.

A "Marcha do golpe" foi criada para comemorar a posse de JK, que teve de vencer uma grande resistência, pois houve a intenção de um golpe ou coisa parecida. O boxe e o jiu-jítsu estavam na última moda e os grandes mestres Hélio Gracie e Valdemar Santana no auge da popularidade, o que justificava plenamente a analogia, no contexto político da época.

O encontro com o ser insuportável me fez voltar no tempo. Revi uma cena antiga que achei muito engraçada e que me serviu como lição pra vida toda. Eu era bem pequena, não sei dizer exatamente quantos anos tinha, mas me lembro bem da visita de uma senhora à minha casa. Estávamos sozinhas, mamãe e eu. A visitante tinha mais ou menos a idade de minha mãe, era bonita, vaidosa, usava maquiagem caprichada. Em resumo, bastante chique para os padrões da época. Sobretudo, extremamente espaçosa. Ia chegando e pondo defeito em tudo. Quando terminava de apontar o que considerava como desleixo pessoal da mamãe, que não pintava o cabelo e nem fazia as unhas, começava a enumerar uma extensa lista sobre a feiura e o desmazelo da casa. Usando um leque que cheirava a sândalo, abanava-se cada vez mais rápido, esticando o braço para mostrar os "horrores" que via. Teias de aranha? Não perdoava nenhuma. Poeira? Uma indecência. Coisas fora do lugar? Pornografia pura. Se mamãe lhe servia café, dizia que estava fraco ou doce demais. Sucos? Considerava-os indigestos. Até defeito na água ela punha, dizendo que era preciso lavar a vela do filtro de tempos em tempos, pro líquido não ficar com gosto de barro. Enfim, era assim, a crítica em pessoa.

Ela não aceitava a ideia de que mamãe tinha outro tipo de vaidade, mais sutil e sofisticada, e que era uma pessoa nada convencional. Creio que nem lhe passava pela cabeça que isso podia existir, obcecada que era com sua própria aparência.

Como boa libriana, minha mãe não gostava de confrontos e nem tampouco de gastar vela com defunto ruim. Fingia concordar com a visitante, rindo ironicamente, repetindo a cada observação do entojo: "deveras, madame X?", até que ela desistia das provocações, vendo que daquele mato não sairia coelho, pois mamãe não lhe opunha resistência, e ia embora com seus saltinhos barulhentos.

Certa vez, depois de uma dessas visitas, mamãe fez algo que achei notável: com um pano de prato começou a se abanar, imitando os movimentos da tal madame X, cantando alto "Você quis me dar o golpe, mas eu soube me esquivar", enquanto dançava pela cozinha, rindo muito. E eu, que vivia tentando entender por que ela não respondia às provocações da madame X, que quase me matavam de raiva, danei a cantar e a dançar também. Foi a minha primeira lição sobre a esquiva, movimento fundamental no boxe.

Mamãe detestava pessoas fofoqueiras e pegajosas, que queriam forçá-la a uma intimidade que não desejava ter. Era livre, não gostava de dar satisfação de seus atos, hoje vejo com clareza como ela se sentia bem sozinha. Certa vez, bateram palmas na porta (não existia campainha na casa) e ela, extremamente intuitiva, já sabia quem era e mandou-me dizer que não estava em casa. Foi esconder-se longe, no fundo do quintal, agachada atrás do tronco de uma mangueira enorme que tínhamos. Quando voltei, encontrei-a gargalhando e comecei a rir também, até fazer xixi na calcinha. Para uma criança, ver a mãe mentir e desfrutar da própria mentira é algo simplesmente delicioso. Ainda mais quando essa mãe tem fama de responsável, exigente e severa.

Esses episódios fizeram-me refletir sobre a importância da esquiva não só no boxe, mas também na vida. Em alguns casos, como não sair cantando a "Marcha do golpe"? Não é bom a gente pensar que já enfrentou até o Hélio Gracie e o Valdemar Santana? E, como na vida a força dos oponentes é grande demais se comparada à dos adjuvantes, a esquiva representa, sem dúvida, a melhor forma de "vingança branca" que conheço.

Rosângela Vieira Rocha

sexta-feira, 15 de março de 2013

Divulgar emagrece: seja um divulgador você também!



Está comprovado. Divulgar emagrece, enrijece músculos e exercita a paciência.

É mesmo uma profissão de risco, raça e adrenalina. Exige noções de psicologia, educação, oratória, artes circenses, artes cênicas, artes marciais, neurolinguística, moda, bom senso, gastronomia, trânsito, filosofia, teologia, física quântica... Ufa! Haja criatividade e jogo de cintura.

Como vou muito às escolas acompanhado por divulgadores, quero contar algumas curiosidades, manias e características de algumas figurinhas carimbadas:

- Conheço um divulgador que usa uma camiseta popular para dirigir e uma camisa de grife para entrar na escola. Uma vez, ele dirigiu de chinelos até o estacionamento. Daí, retirou dois sapatos bem engraxados de um saco plástico e os calçou. Entrou como um lorde na sala da coordenação.

- Conheço uma divulgadora que fala tanto, mas tanto, que não dá brecha para ninguém pensar. Ela pergunta e ela mesma responde. E como vende!

- Existe um divulgador, muito simpático e tagarela, que cumprimenta até os cachorros da portaria. Aliás, ele tem uma memória de elefante, sabe o nome de todos os porteiros das escolas. E vende livro como pãozinho fresco!

- Por outro lado, conheço uma divulgadora que fala o essencial, a presença dela preenche o ambiente de paz. Ouve tudo o que os outros têm a dizer. Depois, em poucas palavras, dá o seu recado. É batata! Sempre consegue o que quer.

- Uma vez, um divulgador me levou a uma escola por engano, no outro extremo da cidade. Curiosamente, a coordenadora dessa escola nos fez uma proposta: se eu me apresentasse para os seus alunos, ela faria uma adoção no bimestre seguinte. E cumpriu a palavra. O melhor de tudo foi que a coordenadora da escola para onde deveríamos ter ido ficou aliviada e comentou conosco que havia cometido um erro ao agendar a atividade em semana de prova. Apenas me pediu para autografar os livros dos alunos e educadores. O divulgador distraído e eu rimos e nos cumprimentamos.

- Geralmente, as divulgadoras usam protetor solar para dirigir e têm água, frutas, barras de cereais, balas, lenços de papel, agulha, linha e uma perfumaria no carro. Já os divulgadores suam como cascata e costumam ter desodorante, água e balas no carro, mais nada. Mas os divulgadores adoram parar em padarias para beber suco, cappuccino ou pingado, comer um pão de queijo ou um pão com manteiga na chapa. Quanto às divulgadoras, preferem saciar a sede e a fome na escola.

Enfim, sair com um divulgador, é, com certeza, deixar a monotonia de lado, pois algo inesperado e mágico sempre acontece. Aliás, de que adianta escrever e editar livros se não há quem os divulgue? Agora, cá entre nós, uma editora sem divulgador é como um carro sem motorista. Não sai do lugar, não é mesmo?

Bem, fica registrada a gratidão que todos os profissionais do livro e leitores têm para com esses imprescindíveis parceiros.

Saúde e felicidade aos divulgadores!

Amigavelmente.

Jonas Ribeiro, escritor

segunda-feira, 11 de março de 2013

Às marias do Brasil - no Dia Internacional da Mulher


Sempre que surge uma data comemorativa, me pergunto: Por que apenas um dia? Por que não lembrar isso todos os dias do ano? Aí meu lado racional tenta explicar que uma data é um resumo, uma chamada, um compromisso com o objeto da homenagem. Por isso, o Dia Internacional da Mulher. Ocasião propícia para que se formulem ou se intensifiquem políticas públicas que ajudem a diminuir o secular abismo que sempre separou o homem da mulher; que as mulheres consigam entender a responsabilidade que devem ter para com elas próprias, para que se enxerguem como seres de importância real para a construção de um mundo melhor, onde não devem mais ser permitidos atos de violência. E me refiro à violência com todas as suas faces cruéis: a física, a sexual, a moral, a econômica, a doméstica, a social e tantas outras que surgem a cada dia.

E é às marias brasileiras que dedico um poema de Cora Coralina. Cora, coral, coralina, aquela que foi um dos maiores símbolos da luta pela afirmação da mulher, numa época em que as condições eram adversas e perversas. Ainda assim, essa mulher vigorosa, à frente do seu tempo, nos deixou um legado que traduz toda a sua sensibilidade, numa visão futurística do real papel que as mulheres devem exercer na sociedade. Das panelas de doce às páginas literárias, uma caminhada palmilhada de sofrimento e de alegria; de realidade e de sonhos; uma vida tecida com a mais fina renda da feminilidade.

Elba Gomes



Assim eu vejo a vida

Cora Coralina

A vida tem duas faces:
Positiva e negativa
O passado foi duro
mas deixou o seu legado
Saber viver é a grande sabedoria
Que eu possa dignificar
Minha condição de mulher,
Aceitar suas limitações
E me fazer pedra de segurança
dos valores que vão desmoronando.
Nasci em tempos rudes
Aceitei contradições
lutas e pedras
como lições de vida
e delas me sirvo
Aprendi a viver.

sexta-feira, 8 de março de 2013

O que você, mulher, pensa sobre dinheiro?



Ao longo de nossa existência, construímos um sistema de crenças ao qual somos muito fiéis. Nele estão contidos ensinamentos frente à vida e também ao dinheiro.

Nós, mulheres, aprendemos muitas vezes que “finanças são para homens”, que “dinheiro é algo complicado”, que “investimento é para quem ganha muito” ou ainda que “mulheres não têm inteligência para números”.

Se quisermos melhorar nossa saúde financeira, precisamos rever nossos pensamentos, sentimentos e posturas diante do dinheiro.

Abrir a mente para novas possibilidades de enriquecimento é essencial: “finanças também são coisas de mulher”; “investimento é para todos”; “mulheres podem enriquecer sozinhas ou acompanhadas!”

Pontos frequentes, no mundo feminino, são a falta de conhecimento financeiro para poupar e o impulso de consumir.

Para essa desinformação existe remédio: investir em educação! E hoje temos educação financeira de qualidade, disponível para todos: em livros, internet e em seminários práticos espalhados por todo o país.

Já o impulso de consumo precisa ser visto com cuidado, pois é algo complexo, que envolve inúmeros fatores. Um deles está ligado ao nosso estado emocional e autoestima. Nosso amor próprio influencia diretamente na nossa relação com o mundo e também com o dinheiro. Se nos sentirmos mal-amadas, ficaremos mais vulneráveis a qualquer compulsão. Se nos apreciarmos e estivermos felizes, não necessitaremos consumir tanto!

O vazio interior nos faz buscar preenchimento, frequentemente, em questões que, na realidade, não nos nutrem, como excesso de comida, de álcool, de compras etc. Precisamos nos perguntar: estamos realizadas? Nossos relacionamentos são satisfatórios? Sentimo-nos integradas e importantes no grupo a que pertencemos?

É fundamental percebermos o que realmente está faltando em nossas vidas para não nos deixarmos seduzir pelo prazer volátil do consumo. Ele não suprirá nossas carências mais profundas. Temos várias necessidades físicas, emocionais, intelectuais, sociais, espirituais, que devem ser atendidas para que tenhamos uma saúde integral. Só assim estaremos fortes para resistir aos apelos do capitalismo.

Para muitas de nós, o dinheiro ainda é um tabu e algo estranho, do qual muitas têm medo. O aliado do medo é a ignorância. Informe-se! Conheça o mercado financeiro! Estude as melhores opções de investimento para você!

É importante pensarmos que, se somos capazes de produzir dinheiro, também o somos para gerenciá-lo, de forma criativa e inteligente. Aprender a gerar e poupar dinheiro, sabendo desfrutar dele, são atitudes sábias!

É recorrente vermos mães sentirem-se culpadas por estarem pouco em casa e tentarem suprir esta ausência com presentes e guloseimas para os filhos. A culpa, aqui, é a inimiga nº 1 do enriquecimento, pois ela fomenta o desperdício. É impossível aliviar a culpa de nossa ausência com bens materiais. Precisamos separar dinheiro de afeto, pois essa mistura produz dívidas descabidas.

Trabalhar e enriquecer, sem deixar de ser feminina, é possível. Nosso desafio é sermos competentes na tarefa de organização financeira, sem nos masculinizarmos e sem nos desligarmos de nossa real natureza. Podemos ter sucesso financeiro com maturidade, segurança e delicadeza, que é a marca registrada das mulheres que somos!


Angélica Rodrigues Santos é professora, psicóloga, especialista em Psicologia Clínica, Organizacional e do Trabalho. Analista transacional e bioenergética, com treinamento em EMDR e hipnose. Possui formação em Sexualidade Humana e Constelações Familiares. Palestrante, psicoterapeuta individual e de grupos; atua especialmente na área de Finanças Comportamentais e Processos de Emagrecimento. Consultora da Libratta Finanças Pessoais. Autora do livro “Família, afeto e finanças – como colocar cada vez mais dinheiro e amor em seu lar”, em parceria com Rogério Olegário do Carmo.

terça-feira, 5 de março de 2013

Recaída



Olha só onde é que eu tava naquele dia: preparando exames de risco cirúrgico para proceder minha histerectomia subtotal por videolaparoscopia. No resultado da esteira, surgiu um indicador de que haveria risco de isquemia cardíaca. Duas possibilidades: alguma disfunção cardíaca ou deficiência hormonal própria de mulheres da minha idade, próximas da menopausa, com queda na produção de hormônios. O cardiologista não podia ficar na dúvida. Me mandou fazer uma cintilografia do caroção. Do coração. Tive que tomar uma injeção de um líquido radioativo que iria brilhar no escuro da câmera onde entrei para me submeter a fotos sequenciadas de todas as partes do músculo cardíaco. Ali dei a primeira pala. Coração disparado, pânico de ter que ficar imóvel. Só porque a moça mandou ficar imóvel, não respirar com força, não tossir, não esgagar. Não engasgar. Taquicardia braba, medo, pânico. Era o teste em repouso. Poucos dias depois, o de esforço, após correr na esteira e tomar na veia outra injeção de líquido radioativo. Novamente a câmera, imóvel, sem tossir ou respirar forte. Nova taquicardia, mais branda, novo pânico.

A cintilografia não deu nada, mas fiquei depois disso com medo de estar sofrendo de algo. Bateu aquela ideia de que a idade é de risco. Fui pra cirurgia com pequeno receio. E se a anestesia me fizesse mal? E se morresse ou tivesse um piripaque na mesa de operação? No dia, a cena: entro no hospital cagando tudo. Numa salinha tiro toda a roupa. Me sentam numa cadeira de rodas. Na porta do centro cirúrgico, entrego à Irmã Mais Velha os óculos, perco o contato visual com o mundo, engulo lágrimas que escorrem fugitivas. A enfermeira me autoriza a chorar. “Todos têm medo”, garante. Olho pros lados, a médica chega, a anestesista se apresenta, não vejo mais nada.

Abro os olhos, o Médico Amigo e Ex está ali, conforme o prometido, zelando para que tudo me cercasse de segurança. Penso que é meio-dia e meia, são três da tarde. Tem um caninho de plástico no meu nariz. Volto pro quarto, encontro as irmãs, a Mãe, não sei bem em que ordem. Quando chega a noite e tenho que tomar uns remédios mais fortes contra a dor, o segundo susto: ela me aplica uma droga muito pesada, que me faz sentir pânico, a cabeça fica louca, agarro a mão da Cunhada Irmã e temo morrer. Grito para a moça não sair do quarto porque posso morrer. Ela diz que o remédio é mesmo muito forte, que posso não querê-lo mais. Imploro que anote na ficha para nunca mais me aplicarem aquilo, senão morro ou enlouqueço.

Dali em diante, no pós-operatório, se divide a minha relação com os medicamentos. Quero parar de tomá-los o quanto antes, me dão tonteiras, receio a volta da reação de enlouquecimento. Angústia, ansiedade me deixam quase louca. “Não é para quem quer”, garante a Analista. Enlouquecer não é pra mim. Mas os sintomas do pânico posso. E voltam. Peço a volta do Lexotan. Tenho medo de ficar sozinha, de entrar no avião e não dar conta de ficar ali dentro. O Lex me permite embarcar sozinha de volta à cidade onde moro, aos braços do Amado. O Lex me acompanha nas horas em que temo comer, ficar sozinha, não dormir, não engolir o remédio, nas dores no corpo, na ansiedade que empurra o tempo em câmera lenta...

Ela não sabe mas precisa escrever pra se salvar da loucura. Da ansiedade doentia que lhe tira o controle sobre os sintomas que a circundam, encostam, vão e voltam. Que vão, não voltem! Que a libertem logo da prisão que impede a escrita libertadora. A salvação. A palavra. A confissão. Confesso a Deus todo-poderoso que preciso confessar a mim mesma o que preciso dizer. Está tudo ali, ela sabe e não vê, ela vê e não sabe.

Clara Arreguy

sexta-feira, 1 de março de 2013

Desejo




Eu quis um amor enclausurado,
cercado de mil espelhos,
nos quais eu visse várias faces,
como num caleidoscópio.
Eu quis um amor solto na brisa,
em cambalhotas ao sabor do vento,
seguindo remoinhos de poeira.

Eu quis um amor de remota origem,
retratado nas pinturas rupestres,
esquecido pela tradição oral.
Eu quis um amor efêmero,
que se prolongasse por um átimo,
no encontro furtivo de um olhar.

Eu quis um amor voluptuoso,
cheio de línguas e dentes,
de braços e de mãos,
de calafrios, espasmos e calor.
Eu quis um amor casto e puro,
inocente como São Francisco.

Eu quis um amor sem solução,
uma inequação de fórmula genérica,
que eu nunca soube resolver.
Eu quis um amor dimensionado
pela aritmética que aprendi na escola:
problemas simples com ovos e maçãs
envolvendo as quatro operações.

Desejei tantas coisas...
Quis o amor solto, casto, simples,
efêmero, contraditório, irresponsável.
Mas cansado desses mimetismos,
o amor, exausto, se escondeu.
E hoje, cultora que sou de adjetivos,
Contento-me com o amor vazio.

Edna Vieira Rocha de Rezende